sábado, 24 de dezembro de 2011

Sublimação social e educação


Sublimação é um velho conceito da Química que descreve a passagem de um elemento do estado sólido para o gasoso, sem passar pelo líquido. Pois me ocorre agora que, no Brasil, está-se dando um processo de sublimação na esfera social. Seguinte: com o governo Lula, cerca de 30 milhões de brasileiros foram incorporados ao mercado de consumo, por terem conquistado maior poder aquisitivo sem que isso tivesse sido acompanhado por mais educação em suas vidas. Quer dizer: aumentaram a renda sem, necessariamente, aumentar o repertório cultural.
Com mais dinheiro no bolso, essa imensa galera vai às compras em ritmo frenético: automóveis em sessenta prestações, todos os itens da linha branca, casa própria, viagens de lazer e tudo aquilo que a TV sugere. A TV. Esse é o ponto. 

Com dois ou três aparelhos em casa, a família recém entrada na classe média é literalmente domesticada por essa máquina eletrônica. Hebes e Faustões, Hucks e Gugus, CQCs e BBBs alimentam permanentemente a "cultura das celebridades" e o seu contrapeso, a música sertaneja, o pagode romântico e o axé da Bahia. Dessa teia, não tem quem se livre!
A escola, que não ocupa tanto espaço na preocupação dessa turma, é a pública, com todas as deficiências, ou a particular de terceira categoria, para que a mensalidade caiba no orçamento. Se passam em vestibular, a maioria vai para as faculdades privadas que, na maior parte, tomam o estudante por freguês. Brigar por melhores condições de ensino é papo pra marciano; essa turma briga mesmo é se o time do coração cair para a "segundona".
A situação é deplorável, mas, também, um belo desafio. Não me canso de dizer que a palavra de ordem é qualidade: na educação, na relação com o meio ambiente, nas relações sociais. Estamos vencendo a fome e a pobreza material, mas ainda temos um belo e gigantesco trabalho de construção humana a ser iniciado.
E precisamos de um, dois, cinco, dez mil "vietnãs educacionais" em cada ponto do país detonando a maré de mediocridade que hoje é uma onda, mas amanhã pode virar cultura.
Com todos esses propalados avanços na esfera socioeconômica, não nos custa lembrar que, da meta fixada, há dez anos, de colocarmos 30% dos nossos jovens entre 18 e 24 anos no nível superior de ensino, até 2010, só conseguimos incluir 16% e, ainda assim, 75% desse porcentual em faculdade privadas que oferecem formação duvidosa.
Se não lograrmos aproximar nível material de nível de conhecimento e cidadania, estamos apenas fornecendo cimento e tijolo para a construção de uma grande república de boçais.
Jorge Portugal é educador, poeta e apresentador de TV. Idealizou e apresenta o programa "Tô Sabendo", da TV Brasil.

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