
“A minha infância não foi brincadeira”, resgatou Bezerra à autora de sua biografia. José dividia os trabalhos com o irmão, fruto do segundo casamento da mãe. A relação entre o futuro sambista e o padastro era conflituosa. Foi em meio ao cenário oposto que o garoto despertou para a música. “Gostava de cantar. Mas dentro da minha família, que só conhecia trabalho, ninguém admitia esse negócio. Música era coisa de vagabundo”. Em entrevista, Letícia lembra que Bezerra “levou muita surra” por causa de sua vontade de cantar.
Não desistiu. Com a ajuda de um amigo, aprendeu a tocar trompete. Foi o primeiro instrumento que dominou. A pressão da família só cresceu. Foi quando resolveu seguir os passos do pai e ir para a Marinha Mercante. Serviu por volta de dois anos, quando foi abusado sexualmente por um superior e o desacatou.
“Na Marinha Mercante só tem veado”, teria gritado durante uma solenidade oficial antes de ser expulso. A rejeição da família se agravou. José seguiu para o Rio de Janeiro, clandestinamente em um navio de açúcar “com a roupa do corpo, uma calça enrolada no braço e dez conto”. Tinha 15 anos.
Velhos problemas
No Rio, morou por uma semana com a família do pai, mas foi expulso, sob o argumento de que teria ido “somente atrasar a vida” do genitor. Foi para o Cantagalo, onde viveu por 20 anos e aprendeu o samba de partido alto. Em 1950, foi convidado para trabalhar como percussionista na Rádio Clube Brasil. Chegou a ser detido pela polícia incríveis 21 vezes. Não respondeu a nenhum processo.
Entre as décadas de 1950 e 1960, chegou a mendigar. Depois, retormou a carreira. Só viria gravar o primeiro LP, pela Tapecar, em 1970, graças à ajuda de Beth Carvalho. O disco Bezerra da Silva, o rei do coco, foi lançando em 1975. Um ano depois, chegou ao mercado o Volume 2. Vinis disputados nos sebos, estão novamente disponíveis em CD graças ao pesquisador Marcelo Fróes e o seu selo Discobertas. Não demorou para o intérprete de um ritmo tipicamente pernambucano ingressar no mundo do samba carioca, virando o porta-voz das favelas, recorte bem traduzido no documentário Onde a coruja dorme (2012).
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