A primeira menção pública sobre o projeto "Eles Voltam" (Brasil, 2014) - primeiro longa-metragem de ficção de Marcelo Lordello que entra em cartaz nesta sexta (7) no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco e no Cine São Luiz - aconteceu há oito anos. Era dezembro de 2006 quando a coordenação do concurso de roteiros Ary Severo/Firmo Neto anunciou que os roteiros de Lordello e de Eric Laurence (por "Azul") eram os contemplados daquela edição com R$ 80 mil (cada um) para realizar um curta-metragem.

O maior valor de "Eles Voltam", entretanto, não está em nenhum troféu, mas em si próprio. Está na beleza e na riqueza de sugestões visuais e humanas que os olhos da menina Cris (Malu), aos 12 anos de idade, testemunham durante sua forçada peregrinação. Está na composição cinematográfica deste compulsório percurso em direção a um mundo no qual a menina é quase uma estrangeira.
Sua odisseia inicia quando ela é deixada por seus pais no meio do nada, à beira de uma estrada na Zona da Mata pernambucana com seu irmão mais velho, Pêu (Georgio Kokkosi). O que deveria ser um susto como castigo por um mau comportamento transforma-se numa longa espera sem a certeza da volta. Ainda no prólogo de "Eles Voltam", Lordello, auxiliado pela bela fotografia de Ivo Lopes Araújo, constrói a perfeita atmosfera na margem da rodovia como um lugar como inóspito tanto para a pré-adolescente sozinha quanto para nós espectadores.
Cris, como menina de classe média-alta no Recife contemporâneo, assusta-se com qualquer estranho que se aproxima. Mas bastam se encerrar os créditos de abertura, ao som de Milton Nascimento - com música do clássico álbum "Clube da Esquina" -, que Lordello inicia seu processo de desconstrução do outro como uma potencial ameaça. O garoto que passa na bicicleta, por exemplo, é o primeiro destes personagens que irão cruzar pela vida de Cris e apresentar-lhe uma nova perspectiva social. São eles que lhe irão ensinar o que não se aprende em livros, nem na televisão ou nas redes sociais virtuais.
Um parágrafo à parte deve ser dedicado à atuação de Maria Luiza, cuja preparação passou pela orientação da atriz Amanda Gabriel. O olhar ora tímido, ora desconfiado e assustado que Malu dá a sua Cris imprimem o tom preciso àquilo que o roteiro de Lordello pede. É, inicialmente, o olhar de quem não entende seu novo ambiente, e depois vai olhando para ele
e para seus personagens com carinho e compreensão. Ao final, ela terá amadurecido, e sua relação não será a mesma nem com sua família nem com a vida social que a cerca.
"Eles Voltam" é filme para ser visto e revisto. De preferência com pais e filhos juntos, compartilhando o aprendizado dessa viagem em direção ao amadurecimento humano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário