Depois de concluir um tratamento de linfoma, câncer descoberto sete meses antes, Gecélia se preparava para atuar na área de psicologia, dando início a sua vida profissional depois de formada. Em menos de um mês, começou a experimentar momentos de tontura, fraqueza e visão turva. “Voltamos aos médicos e diagnosticaram a Síndrome paraneoplásica de Eaton-Lambert. Foi quando o problema começou a assustar. Nos disseram ser uma reação do próprio corpo à presença do tumor, mesmo já tendo sido constatada a remissão”, conta Samuel. Visão, coordenação motora, reflexos e até a deglutição, capacidade de engolir alimentos, seriam comprometidos nos próximos meses. Audição e força muscular foram perdidas e recuperadas após sessões de imunoterapia. “Em dezembro, veio a notícia mais triste. O médico afirmou que ela sofria não apenas de uma, mas de duas síndromes. Uma delas, até hoje, não se tem certeza do que seja, o que impede um tratamento mais efetivo”, complementa.
Para tentar conseguir o exame, Samuel resolveu agir. Aproveitando a vinda de Dilma Rousseff a Pernambuco, no primeiro semestre deste ano, foi à solenidade de inauguração do conjunto residencial Via Mangue, munido de uma carta para a presidenta. “Fiz amizade com um segurança, que ficou de entregá-la. Deixei nas mãos de Deus. A resposta veio um mês depois, por uma funcionária da Secretaria de Saúde, que disse ter recebido a demanda do Ministério. Solicitei o exame, mas no final de agosto, um ofício da instância estadual negou o pedido”, afirmou. Segundo a Secretaria Estadual de Saúde, os exames solicitados pelos familiares não estão inclusos na lista de procedimentos do SUS, que só pode ser alterada pelo Ministério da Saúde e reitera, em nota oficial: “não há justificativa legal para que a SES libere os procedimentos solicitados”. Neste caso, o custeio dos exames passa a ser possível apenas na instância judicial. O processo será aberto, nesta sexta-feira, no Juizado Especial do Recife.
Hoje, Gecélia deixou as idas aos hospitais, cuja maior internação chegou a 70 dias. O “Home care”, atendimento médico residencial custeado pelo plano de saúde, também teve que ser conquistado na Justiça. Lentamente, uma rotina familiar volta a ser desenhada. Após meses de licença do trabalho, Samuel, que é engenheiro, voltou à empresa onde é empregado. Divide tempo e atenção entre a carreira, os cuidados com a esposa e suas consequentes burocracias e a paternidade. “Tem sido difícil. Ter que criar um quarto separado para a mulher com quem divido minha vida há 18 anos. Ver que meu caçula, quando está chorando, já não chama mais ‘mamãe’, porque sabe que não vai adiantar. Às vezes, preciso entrar no meu canto, com meu violão, ouvir música e ‘desabar’”, conta o pai de Rafael, 3, e Gabriel, 5. “Algumas vezes, não faço ideia do que fazer ou de como fazer. A única coisa que eu sei é que meu lugar é ao lado dela”.
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