Mudança climática não é um problema para
o fim do século. Acontece agora, causando impactos no ambiente e nos
seres humanos em todos os continentes e através dos oceanos. No futuro
amplificará os riscos já relacionados ao clima e criará novas ameaças
para os sistemas naturais e humanos. E, por enquanto, o mundo está muito
pouco preparado para lidar com a situação.
Em poucas palavras, esse é o quadro
pintado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC)
na segunda parte do seu quinto relatório, divulgado no domingo, 30, à
noite (horário de Brasília), em Yokohama, no Japão.
A mensagem está presente no Sumário para
Formuladores de Políticas, uma introdução não técnica do documento de
mais de 2 mil páginas e 30 capítulos, que trata dos impactos, adaptação e
vulnerabilidade às mudanças climáticas.
Com a constatação de que o mundo já está
pagando a conta pelas emissões desenfreadas de gases do efeito estufa
ocorridas desde a Revolução Industrial, o relatório aponta que ainda há
oportunidades para lidar com os riscos. Na maior parte dos casos medidas
sérias de adaptação podem fazer com que riscos que seriam de alto
nível, se nada for feito, sejam médio ou baixo.
No entanto, quanto mais tempo se levar
para fazer isso, a dificuldade vai aumentar, assim como os custos.
“Magnitudes crescentes de aquecimento aumentam a probabilidade de
impactos severos, generalizados e irreversíveis”, afirma o sumário. E
haverá um limite além do qual talvez não haja mais o que fazer.
“A mensagem mais importante do relatório
é que a gestão da mudança climática é um desafio de gerenciamento de
riscos. Vemos uma ampla gama de possíveis resultados - alguns deles
muito sérios. E vemos as mudanças climáticas interagindo com outros
fatores, muitas vezes agindo como multiplicador das ameaças”, disse ao
Estado o pesquisador americano Chris Field, co-chair do Grupo de
Trabalho 2, que elaborou o texto.
“O problema real não é se teremos 2ºC ou
3ºC de aquecimento, mas se uma seca, por exemplo, vai aumentar a
propensão a incêndios - que, uma vez que começam, se estendem por
milhares de quilômetros quadrados. É uma questão de gerenciamento de
risco.”
O relatório destaca experiências feitas
ao redor do mundo, mas em escala muito pequena. “As pessoas tendem a
pensar que um passo gigante vai resolver tudo. Porém, talvez sejam
necessários 500 pequenos passos.”
DIMENSÃO HUMANA - Os impactos já
observados afetam a agricultura, a disponibilidade de água, a saúde
humana, os ecossistemas no continente e nos oceanos, e alguns modos de
vida. Em geral, os problemas têm ocorrido em todo o mundo, sejam países
ricos ou pobres, mas o grau de vulnerabilidade varia.
Ao longo do século 21, as mudanças
climáticas podem “desacelerar o crescimento econômico, fazer com que a
redução da pobreza seja mais difícil, erodir ainda mais a segurança
alimentar e criar novas armadilhas da pobreza, particularmente nas áreas
urbanas e pontos onde há muita fome”, diz o relatório.
Segundo Field, ao contrário dos textos
anteriores do IPCC, este teve um foco maior na “dimensão humana”. “Mais
atenção sobre como as pessoas serão afetadas pode ajudar a garantir que
elas saiam de uma condição de fome ou violência e tenham uma vida mais
confortável.”
A iniciativa foi bem recebida por ONGs ambientalistas que acompanharam os trabalhos na semana que passou.
Um dos temas aprofundados foi a
segurança alimentar. Em 2007, o IPCC colocava, por exemplo, a
possibilidade de que regiões mais altas e frias poderiam se beneficiar
se tornando mais aptas para a agricultura - o que talvez compensasse
perdas em outras regiões. Agora, o texto é claro em mostrar que o que
temos visto são apenas impactos negativos. E destaca a relação mais
abrangente do problema, relacionado com o aumento de preços dos
alimentos.
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