Com formação de tecnocrata, a presidente Dilma Rousseff só toma decisões depois de esgotar o debate sobre qualquer problema que chega à sua mesa. Assim acaba de acontecer com o Código Florestal, que ela decidiu vetar parcialmente, depois de muita conversa com lideranças dos partidos que apoiam seu governo e representantes do agronegócio e do meio ambiente. O que se diz no Congresso é que, com os vetos, a presidente Dilma Rousseff não atendeu nem aos ruralistas nem aos ambientalistas. Para definir sua posição, teve uma reunião de mais de sete horas com alguns ministros, como o da Agricultura, Mendes Ribeiro, e a do Meio Ambiente, Isabela Teixeira. Ainda não se sabe como ficou o texto do Código Florestal depois dos vetos. O líder do PMDB na Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves, acaba de advertir que o governo dará “um tiro no pé” se tentar ressuscitar, total ou parcialmente, o projeto do Código Florestal tal como foi aprovado no Senado.
“A chance de a Câmara permitir que isso aconteça é zero” – advertiu o deputado Henrique Eduardo Alves, que comanda a segunda maior bancada na Câmara. A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, reconheceu que uma das alternativas em estudo seria o envio de um projeto de lei ao Senado para preencher as lacunas que os vetos da presidente Dilma certamente deixarão no texto do novo Código Florestal. Por que o Palácio do Planalto revela tanta preferência pelo Senado? Pela simples razão de que, ainda que os deputados alterassem o texto, o projeto retornaria ao Senado, perdendo a bancada ruralista o poder de ter a palavra final sobre o assunto, ela que já impôs duas feias derrotas ao governo de Dilma. O governo deve estar preparado para enfrentar o lobby dos ruralistas, que é muito poderoso, sobretudo na Câmara. O líder do PMDB acha que o poder acabará ficando com a Câmara, pois os senadores representam os estados e os deputados é que representam os municípios.
O vice-presidente Michel Temer já anunciou que a presidente Dilma vetará parcialmente o Código Florestal. Não se deve imaginar que os ruralistas tenham poder para derrubar um veto. Isso ainda não aconteceu. Existem mais de 600 vetos para serem examinados pelo Congresso, e as reuniões congressuais para a apreciação de vetos são realizadas a conta-gotas. Dilma reuniu-se, sexta-feira (25/05) com os líderes do governo na Câmara e no Senado, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) e senador Eduardo Braga (PMDB-AM), e o líder do governo no Congresso, senador José Pimentel. O encontro foi para estabelecer como serão preenchidas as lacunas que ficarão na lei que regula o uso da vegetação nativa em propriedades privadas do país. Isso porque o texto aprovado na Câmara deixou algumas questões cruciais sem definição, como a área a ser florestada em margens de rios com largura acima de 10 metros. Ideli Salvatti já anunciou que poderá ser enviada nova proposta ao Congresso.
Todo esse debate ocorre em torno de uma matéria, sem dúvida polêmica, que divide os congressistas. Partidos não têm posições definidas sobre o problema. Cada parlamentar assume uma posição de acordo com suas convicções. A base do governo, que formalmente é composta por 14 partidos e tem cerca de 400 deputados, se divide diante de uma matéria tão complexa e polêmica quanto o Código Florestal. O governo, aliás, já deve ir se preparando para enfrentar problemas com a sua base de apoio, sobretudo na Câmara. O PR, o PTB e outros partidos pequenos, que se consideraram excluídos da última reforma ministerial, foram responsáveis pelas deserções que acabaram resultando em duas derrotas do Palácio do Planalto (duas medidas provisórias perderam a validade). É o caso de se dizer que o inimigo dorme dentro da própria casa, quando existe insatisfação entre os chamados aliados de Dilma. E os seus nomes são bastante conhecidos do governo e dos jornalistas...
Os interesses são sempre opostos. Os representantes do agronegócio querem que lei amplie a área de produção (de agricultura e pecuária, entre outros) e não obrigue os proprietários a pagarem pelo reflorestamento ou multas. Sustentam que as alterações na lei podem diminuir a quantidade de alimentos no país. Por outro lado, os ecologistas defendem a necessidade de uma maior proteção ao meio ambiente e à biodiversidade, além do cumprimento de multas já estabelecidas na lei anterior. Por sua parte, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar havia recomendado à presidente Dilma Rousseff o veto integral do projeto, por julgar que ele traria “graves impactos sobre a segurança alimentar e nutricional da população brasileira”. A instituição acredita que o texto do novo Código Florestal contém dispositivos que ameaçam destruir as principais riquezas do Brasil: seus recursos florestais e hídricos.
"Para este Conselho é possível produzir alimentos em harmonia com a natureza ou com baixo impacto sobre o meio ambiente (é o caso dos sistemas agroecológicos e da produção orgânica). Além disso, vem de longe o entendimento de que os problemas da fome e dos altos preços dos alimentos não são resultado da baixa produção de alimentos, mas sim de estruturas sociopolíticas e econômicas injustas – que o Projeto de Código Florestal tende a agravar. Ademais, sabe-se que parcela significativa das terras hoje ocupadas estão subutilizadas", afirma o relatório do Conselho Nacional de Segurança Alimentar.
Os problemas não ficam só nisso. Os pequenos proprietários de terras também se revelam contrários ao texto do Código Florestal aprovado no Congresso, por “tratar como iguais” os latifundiários e os pequenos lavradores. Essa é uma distinção que deve ser definida de forma clara, mais adiante, segundo os pequenos proprietários de terra. Como bem disse o líder do PMDB, deputado Henrique Eduardo Alves, a polêmica sobre o assunto está longe de acabar.
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